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A nova política tarifária dos EUA e o desafio para as transportadoras brasileiras

  • Foto do escritor: Giulian Andrade
    Giulian Andrade
  • 16 de out.
  • 4 min de leitura

1. Contexto: tarifas americanas sobre produtos do Brasil

Em 30 de julho de 2025, foi editada uma ordem executiva nos EUA impondo alíquota ad valorem de 40 % sobre produtos de origem brasileira, com aplicação a partir de 6 de agosto de 2025. EY+1 Essa tarifa “extra” soma-se à tarifa recíproca já existente de 10 %, alcançando, em muitos casos, 50 % de elevação de impostos de importação de bens brasileiros destinados aos EUA. Covington & Burling+2Allyn International+2

Embora existam isenções para alguns produtos (aeronaves civis, insumos agrícolas específicos, energia, entre outros) Covington & Burling+2EY+2, os setores do agronegócio – em especial produtos como café, carne, açúcar –, que tradicionalmente exportavam aos EUA, foram diretamente afetados. Jornal de Comércio+2Covington & Burling+2

Já observam-se retração nos pedidos de compra dos EUA desses produtos e impacto nas rotas comerciais estabelecidas. Jornal de Comércio+2Covington & Burling+2

Esse novo arcabouço tarifário insere uma forte pressão externa sobre a cadeia de exportação brasileira — e, por consequência, sobre os serviços de transporte nacional que operam rotas de escoamento para portos exportadores.


2. Efeitos imediatos para empresas de transporte de cargas

As transportadoras e operadores logísticos que atuam com cargas agrícolas e de insumos dependem da fluidez do fluxo exportador. Com a retração das exportações para o mercado dos EUA, emergem os seguintes impactos práticos:

  • Queda de faturamento: menos embarques equivalem a menos fretes, resultando em margens comprimidas e redução significativa da receita operacional.

  • Suspensão de novos investimentos: aquisição de novos caminhões, equipamentos de apoio (contêineres, máquinas de movimentação, freios especiais etc.) serão adiadas ou canceladas por falta de viabilidade financeira.

  • Manejo de caminhões já adquiridos: muitas empresas financiaram parte da frota. A retração nas receitas tornará difícil continuar honrando parcelas de leasing, financiamento ou arrendamento.

  • Risco de busca e apreensão: nos contratos de financiamento de veículos e de maquinário, cláusulas de inadimplemento podem autorizar a tomada judicial ou extrajudicial dos bens financiados. Se a transportadora atrasar parcelas, há risco substancial de perda dos caminhões.

  • Efeito cascata ao fim da crise: ao final da crise comercial, restarão dívidas a pagar, crédito restrito junto aos bancos, e uma frota reduzida ou inexistente para aproveitar a demanda reprimida que eventualmente retorne.

Em resumo: há risco de que muitas empresas saiam da crise apenas com obrigações financeiras e sem patrimônio operacional para retomar o ritmo.


3. Projeções e risco para médio prazo: o cenário sombrio

Se as tarifas permanecerem ou se ampliarem, o setor de transporte de cargas enfrenta um duplo estrangulamento:

  1. Escassez de crédito financeiro: os bancos poderão se tornar mais cautelosos em emprestar a empresas do setor, sobretudo aquelas com histórico recente de inadimplência ou baixa geração de caixa.

  2. Falência operacional progressiva: sem frota e sem receita confiável, muitas transportadoras poderão entrar em zona de risco financeiro, o que pode levar a pedidos de falência ou dissolução.

  3. Inviabilidade de recuperação espontânea: mesmo quando o comércio externo voltar a se normalizar, a falta de capacidade logística impedirá que as empresas mais fragilizadas participem da retomada.

  4. Concentração de mercado: as transportadoras mais robustas, com patrimônio, liquidez e respaldo institucional, poderão absorver clientes de quem fracassou, gerando maior concentração de mercado.

Portanto, o risco para transportadoras médias e pequenas é alto e exige ação legal e estratégica prévia.


4. Alternativas jurídicas e estratégicas de enfrentamento

Para mitigar ou sobreviver a esse cenário adverso, algumas medidas jurídicas e gerenciais devem ser consideradas:

a) Renegociações contratuaisRenegociar contratos de financiamento, arrendamento mercantil ou leasing — buscando carência, alongamento de prazos ou repactuação de juros — pode aliviar a pressão imediata de caixa.

b) Revisão de cláusulas contratuaisVerificação de cláusulas de vencimento antecipado, garantias, penalidades e possibilidade de exceções em situações de força maior. Contratos mal redigidos são propensos a execuções aceleradas.

c) Proteção patrimonial preventivaEm alguns casos, blindar patrimônio — mediante planejamento societário, segregação de bens e limitações de risco — pode evitar que ativos operacionais essenciais (como caminhões) sejam alvos de execuções.

d) Ação cautelar ou preventiva contra execuçõesNos casos de demandas judiciais já ajuizadas, a empresa pode buscar liminares ou medidas cautelares para impedir busca e apreensão de veículos até que se resolva mérito do débito.

e) Recuperação JudicialEm situação em que o endividamento e a pressão de execuções representam risco à continuidade da empresa, a recuperação judicial é alternativa importante.

  • No processo de recuperação, as execuções ficam suspensas (efeito de stay), impedindo que credores retirem bens essenciais à atividade operacional.

  • Permite reestruturação das dívidas em prazos mais elásticos e renegociação coletiva com credores.

  • Pode preservar a frota, restaurar viabilidade econômica e assegurar que a empresa sobreviva ao período de crise.

  • Contudo, requer projeto viável e cumprimento estrito das normas legais (Lei de Recuperação Judicial e Falências), sob vigilância judicial e de credores.

f) Diversificação de mercado e rotasBuscar novos destinos de exportação (Ásia, África, Oriente Médio) para compensar a queda nos EUA. Ajustar logística interna para servir mercados alternativos com menor exposição ao impacto tarifário.

g) Monitoramento de disputas internacionais / OMCAtuação diplomática e jurídica do Brasil em fóruns internacionais (como a OMC) pode mitigar ou derrubar medidas tarifárias ilegítimas. A evolução desse conflito será decisiva para o setor como um todo.

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5. Conclusão: a advocacia proativa como fator de sobrevivência

O novo panorama tarifário imposto pelos EUA representa um choque externo severo para o agronegócio brasileiro e, consequentemente, para as transportadoras que integram a cadeia logística de escoamento. As empresas mais frágeis estão expostas ao risco de “quebra por falta de caixa”, perda de maquinário, retração operacional e até falência.

Para o advogado que assessora transportadoras, o momento impõe uma postura de:

  1. Diagnóstico estrutural rápido — análise de contratos, garantias e fluxo de caixa;

  2. Ação preventiva imediata — renegociação, proteção patrimonial e medidas cautelares;

  3. Estratégia de recuperação judicial, quando o risco for concreto de insolvência;

  4. Apoio à adaptação operacional — orientação para diversificação de rotas, mercados e logística ajustada ao novo contexto tarifário.

Quem agir com prudência e inovação terá chance de preservar sua frota, manter a empresa viva e, ao fim da tempestade, estar pronto para retomar com força os negócios. Quem esperar reativo demais poderá perder não apenas caminhões, mas a própria razão de existir no mercado.

 
 
 

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